Comprei um imóvel na planta e agora quero rescindir o contrato. Quais são meus direitos?

planta baixa de uma casa

Seja para morar ou para investir, a compra de um imóvel na planta geralmente costuma ser bem atrativa para aqueles que desejam adquirir uma casa, um apartamento ou um lote para construir.

As propostas de venda são de fato muito atrativas. Mas não poderia ser diferente, já que você pagará, desde a assinatura do contrato, por um imóvel que ainda não está pronto para uso.

Por isso, os riscos dessa aquisição devem sempre ser considerados e analisados com muita cautela, para que a expectativa não se transforme em angústia.

Diante desses riscos, a lei e os tribunais entendem que o comprador pode se livrar desse contrato de compra e venda (rescindir o contrato) caso entenda necessário ou caso as obras estejam atrasadas, realizando o chamado “distrato imobiliário”.

Em qualquer dos casos, você sempre terá direito a um reembolso, que varia conforme a tabela abaixo:

No decorrer deste artigo eu te explico tudo o que você precisa saber sobre distrato imobiliário. De posse dessas informações, você não ficará mais nas mãos das construtoras.

Neste artigo, você vai descobrir:

  1. Qual o percentual de reembolso em caso de distrato por iniciativa do comprador;
  2. Qual o percentual de reembolso em caso de obras atrasadas;
  3. Como fica a situação da taxa de corretagem em caso de distrato;
  4. Como fica a situação de quem já mora no imóvel e deseja realizar o distrato.

1. Qual o percentual do reembolso em caso de distrato?

A depender da data da assinatura do contrato com a incorporadora, o desfazimento do contrato (distrato) terá consequências diferentes.

É que no dia 28 de dezembro de 2018, entrou em vigor a Lei 13.786/2018, que passou a regulamentar de vez a situação do distrato imobiliário.

Essa lei também diferenciou a situação dos distratos dos lotes de terreno e dos imóveis edificados (que são os imóveis que possuem alguma construção, como casas, apartamentos, escritórios, etc), que passaram a ter um tratamento distinto.

Mostrarei cada uma das situações a seguir.

– SITUAÇÃO 1: Contratos firmados antes da Lei 13.786/2018

Antes dessa lei, tudo que se tinha eram os entendimentos dos tribunais (jurisprudência), que variavam muito de lugar para lugar, o que trazia muita insegurança jurídica.

Após muito debate, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou o entendimento de que, nos contratos firmados antes da Lei13.7866/2018, as incorporadoras só podem reter até 25% dos já valores pagos pelos compradores.

O tribunal entendeu que esse valor é considerado “adequado e suficiente para indenizar o construtor pelas despesas gerais e pelo rompimento unilateral ou pelo inadimplemento do consumidor”[1].

Antes que eu esqueça, esse percentual deve ser aplicado de maneira fixa, sendo irrelevante o total da despesa que a incorporadora teve com a obra.

Trocando em miúdos, se você assinou o contrato de compra e venda antes de 28/12/2018, você possui o direito de reembolsar no mínimo 75% do valor já pago, independente das despesas que o construtor venha a alegar.

O reembolso acima é igual em se tratando de distrato referente a compra de lote de terreno ou de imóvel edificado.

– SITUAÇÃO 2: Dos contratos firmados após a Lei nº 13.786/2018 e referentes a Imóveis Edificados

Se o seu contrato foi assinado depois de 28/12/2018 e se trata de um imóvel edificado as regras são um pouco diferentes.

É que a lei traz uma distinção em relação aos empreendimentos imobiliários que são protegidos por patrimônio de afetação.

Em termos mais simples, dizemos que o empreendimento imobiliário possui patrimônio de afetação quando a empresa que comanda o negócio separa o seu patrimônio do patrimônio do empreendimento.

Quem trouxe essa possibilidade foi a Lei nº 10.931/04, que prevê que o empreendimento deve contar com CNPJ próprio, contabilidade própria, etc.

Empreendimentos protegidos com patrimônio de afetação são, em regra, mais seguros.

Caso a empresa dona do projeto venha a falir, essa falência não atingirá o empreendimento imobiliário, o que facilitará a compra dele por outros investidores, possibilitando a continuidade da obra.

Agora que você já sabe o que é um empreendimento com patrimônio de afetação, saiba que em caso de distrato, você só terá direito ao reembolso de 50% dos valores já pagos, conforme art. 67-A, § 5º da Lei nº 13.786/2018.

E mais, esse valor só será devido depois de 30 dias da expedição do “habite-se”, que é o documento emitido pela prefeitura, que garante que a obra está concluída e que já está em condições de moradia.

Agora, caso o empreendimento não possua um patrimônio de afetação e você queira rescindir o contrato, você terá direito ao reembolso de 75%, que será pago em 180 dias após o distrato, conforme art. 67-A, § 6º da Lei nº 13.786/2018.

– SITUAÇÃO 3: Dos contratos firmados após a Lei nº 13.786/2018 e referentes a Lotes de Terreno

No caso dos distratos de lotes de terrenos contratados após 28/12/2018, teremos duas diferenças básicas.

A primeira delas é que a incorporadora poderá reter até 10% do valor total atualizado do contrato, limitado ao valor já pago até o momento pelo comprador.

Muita atenção! Perceba que ao contrário da SITUAÇÃO 2, aqui você poderá ficar sem reembolso algum.

Caso tenha comprado um lote de R$ 100.000,00 (cem mil reais) e já tenha pago R$10.000,00 (dez mil reais), a incorporadora não é obrigada a lhe devolver nada.

A segunda diferença é em relação ao prazo de devolução dos valores.

Neste caso, a incorporadora pode efetuar o seu reembolso em até 12 parcelas mensais.

A data de início desse reembolso varia da seguinte forma:

I – em loteamentos com obras em andamento: no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias após o prazo previsto em contrato para conclusão das obras;

II – em loteamentos com obras concluídas: no prazo máximo de 12 (doze) meses após a formalização da rescisão contratual.

Quando nos referimos a obras em casos de loteamento, estamos falando de terraplanagem, asfaltamento, disponibilização de água, luz, etc.

2. E no caso de atraso na entrega do imóvel, qual é o percentual do reembolso?

Nesse caso, o comprador possui o direito de receber integralmente os valores que tenha desembolsado.

Isso porque, o art. 35 do Código de Defesa do Consumidor estabelece que os fornecedores (no caso, as incorporadoras) possuem o dever de cumprir suas ofertas e promessas.

Vale dizer que o inciso III do artigo mencionado estabelece que os valores devem ser devolvidos de maneira atualizada. Veja:

Art. 35. Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha:

(…)

III – rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos.”

Se esse é seu caso, recomendo fortemente que você leia um outro artigo meu publicado aqui no Jusbrasil, cujo título é: “Tudo o que você precisa saber sobre atraso na entrega do imóvel”.

Tenho certeza que ao final da leitura você irá se surpreender e descobrir que possui uma série de direitos e alternativas que podem, inclusive, lhe render um bom proveito econômico.

3. E a taxa de corretagem, também deve ser reembolsada?

analisando gráficos e indicadores

Olha, depende.

No julgamento do Tema 938[2], o STJ entendeu que é legal a cláusula contratual que obriga o comprador a arcar com as despesas de corretagem, desde que essa taxa venha discriminada de forma clara no contrato.

Veja o que ficou estabelecido:

“Validade da cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem”

Dentro dessa lógica, o STJ tem entendido que o comprador não terá direito ao reembolso da taxa de corretagem se deu culpa ao fim do contrato.

Porém, nos casos em que o distrato foi ocasionado por culpa da incorporadora, que atrasou a entrega do imóvel (por exemplo), a taxa de corretagem deve ser arcada por ela, sendo abrangida no percentual que ela pode reter.

Veja recente decisão do STJ:

“nas hipóteses em que o construtor/vendedor dá causa à resolução do contrato, a restituição das parcelas pagas deve ocorrer em sua integralidade, inclusive comissão de corretagem”

(AgInt no REsp 1776797/RO, Terceira Turma, DJe 24/09/2020)

4. E como fica a situação de quem já está morando no imóvel e agora deseja rescindir o contrato?

Olha, aqui não importa muito, você terá direito a rescindir o contrato da mesma forma, mas deverá pagar uma taxa de fruição.

A taxa de fruição é como se fosse um aluguel pago à incorporadora pelo tempo em que você residiu no imóvel.

É uma forma de compensar o incorporador pelo período que o comprador teve a posse do imóvel.

A cobrança é legal e as incorporadoras geralmente já descontam essa taxa do saldo a ser reembolsado a você.

Atenção! Aqui é indiferente se o contrato foi assinado antes ou depois da nova Lei do Distrato, o comprador sempre terá de pagar a taxa, conforme entendimento dos tribunais[3].

A Lei do Distrato estabelece que a taxa será de 0,5% ao mês em caso de imóvel edificado (art. 67-A, § 2º, III) e de 0,75% ao mês em caso de lote de terreno (art. 32-A, I).

Bem, acredito que eu tenha conseguido expor até aqui os principais direitos que você precisa saber na hora realizar um distrato imobiliário.

Espero que tenha gostado desse conteúdo!

[1] (REsp 1723519/SP, Segunda Seção, DJe 02/10/2019)

[2] https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/622839862/recurso-especial-resp-1747307-sp-2018-0144216-2

[3] https://tj-mg.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/1141471965/apelacao-civel-ac-10000205522113001-mg

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